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Volta ao Alentejo em Bicicleta. Como tudo começou, em 1984

Luís Godinho texto

Está na estrada a 40.ª Volta ao Alentejo em Bicicleta. Histórias da “Alentejana”, iniciada em 1984 por vontade das autarquias, contadas por Alfredo Barroso, o homem que durante 25 anos foi o seu diretor desportivo.

Para recordar como tudo começou, sublinha Alfredo Barroso, o “mítico” diretor da Volta ao Alentejo em Bicicleta, é preciso evocar o nome de algumas pessoas, entre as quais o já falecido Manuel Francisco, conhecido em Évora como Manuel da Gaita e homenageado com uma rotunda onde se encontram duas bicicletas, e Joaquim Mendes, à época vereador na Câmara de Évora. Estávamos no início da década de 80. 

“Foram eles os verdadeiros pioneiros de uma prova de ciclismo no Alentejo, com o apoio da Associação de Ciclismo de Lisboa”, refere Alfredo Barroso, lembrando que a Câmara de Évora “deu os primeiros passos na organização” e cada autarquia comparticipou nas despesas do modo que entendeu. 

Na história desses primeiros momentos da “Alentejana” estão também registados, entre outros, os nomes de Aníbal Oliveira, “um homem que percebia deste tipo de organização”, uma vez que trabalhava na Associação de Ciclismo de Lisboa, e de António Adegas, de Santiago do Cacém, um antigo ciclista com a vantagem suplementar de “conseguir arranjar carros”, numa altura em que as marcas “não patrocinavam as provas e cada um tinha de se desenrascar” como pudesse para acompanhar o pelotão.

A primeira Volta ao Alentejo foi para a estrada em 1984. O primeiro vencedor foi Paulo Ferreira. No ano seguinte triunfou Marco Chagas. À terceira edição, a Câmara de Évora, que tinha suportado boa parte dos encargos com as edições anteriores, marca uma reunião com os outros municípios. Ou estes se envolviam ou a prova acabava. 

Por essa altura, tinha Alfredo Barroso acabado de ser eleito presidente da Câmara de Redondo. Convocado para a reunião, fez-se acompanhar por Manuel Vitorino, um funcionário da autarquia que tinha sido ciclista amador. “Decidi levá-lo a essa reunião, embora ele soubesse tanto como nós de organização de provas. No final, como o Joaquim Mendes ia sair [da autarquia], foi preciso escolher um diretor. Olharam todos para mim e disseram que ficava eu. Sabe porquê? Porque era o único que conhecia um engenheiro que tinha sido ciclista. Foi assim que eu apareci na Volta ao Alentejo, sem qualquer ligação anterior à mobilidade”, conta Alfredo Barroso, que haveria de ficar nesse “posto” durante 25 anos.

Por essa altura, como é bom de ver, a prova era “completamente” diferente. “As equipas, nessa altura apenas portuguesas, vinham participar e ficavam a dormir em quartéis de bombeiros ou em associações culturais pois a moda dos hotéis só chegou passados alguns anos. Dormia-se em colchões estendidos no chão ou naquelas camas articuladas próprias dos hospitais. Era assim para os ciclistas e para os elementos da organização”. Os orçamentos eram pequenos e ocasiões havia em que, terminada a etapa, era preciso percorrer algumas dezenas de quilómetros e ir dormir a casa. 

A “Alentejana” prolongava-se por sete dias (hoje são cinco). E cada etapa começava no local onde a anterior tinha terminado. Os jantares tornaram-se “lendários”, sempre acompanhados por animação cultural, que tanto podia estar a cargo de um contador de histórias como de um poeta popular. O antigo diretor da prova lembra, a este propósito, as crónicas de Homero Serpa [jornalista de A Bola falecido em 2008] que, a partir de determinada altura, passou a vir acompanhado de outro jornalista que tratava das classificações e do relato das etapas. “O Homero escrevia umas crónicas sobre o que vivia, intituladas ‘Hoje Corro Eu’. Eram retratos do Alentejo. Uma delas intitulava-se ‘O Padeiro Adormeceu’ porque o padeiro, onde tínhamos deixado um leitão a assar, deixou-se dormir e o bicho ficou esturricado”.

O trajeto, que como adiante se verá nem sempre era isento de polémica, esse era desenhado pelo próprio diretor da prova. Alfredo Barroso metia-se à estrada e “lá ia de automóvel, muitas vezes sozinho, com um gravador ao lado para registar todas as indicações do que seria necessário sinalizar. Era assim de Garvão à Serra de São Mamede. Chegava a casa, escrevia aquilo tudo e estabelecia o percurso que os ciclistas iriam efetuar”. 

Um ano marcante, outro, foi o de 1996 quando por cá andou Miguel Indurain, o vencedor da Volta a França em Bicicleta entre 1991 e 1995. Para o convencer, Alfredo Barroso e o jornalista Fernando Emílio foram à Volta à Andaluzia, acorreram ao hotel onde a equipa estava instalada e montaram “um verdadeiro ataque” a Miguel Indurain. “Ficámos praticamente com a certeza de que ele viria”. Não só veio como, sem surpresa, terminou com a camisola amarela.

A presença de ciclistas de topo a nível mundial levou a que a prova “encolhesse” para cinco dias, tornando mais complicado o desenho dos percursos. Em certo ano, lembra o ex-diretor, quando a comparticipação das câmaras passou a ser feita de forma diferente, “com um valor para as partidas, outro para as chegadas e outro para as passagens” do pelotão, tornou-se vantajoso passar pelo maior número possível de concelhos. “Beja queria ser o local da partida, Cuba o da chegada, então tive de traçar um longo percurso entre as duas”. Bem longo, na verdade, já que foi uma etapa com 249 quilómetros a ligar dois municípios vizinhos.

Outra curiosidade da Volta ao Alentejo é que ao longo de 39 edições só um ciclista, o espanhol Carlos Barbero, conseguiu triunfar por duas vezes, em 2014 e 2017. O ano passado o vencedor foi o venezuelano Orluis Aular.

CICLISTAS NA ESTRADA ATÉ DOMINGO

Está na estrada, até ao próximo domingo, dia 26, a 40.ª Volta do Alentejo, cuja principal novidade, este ano, é a não realização do habitual contrarrelógio da penúltima etapa. A prova iniciou-se, em Beja. Ontem os ciclistas percorrem uma etapa entre Castro Verde e Grândola. Hoje chegarão a Estremoz, tendo partido de Vendas Novas. No sábado o pelotão estará pelo Alto Alentejo, com uma etapa entre Crato e Castelo de Vide. No domingo a partida será de Monforte e a meta estará instalada, como habitualmente, em Évora.

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