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Unidas de facto, 16 freguesias alentejanas pedem o “divórcio”

Ana Luísa Delgado texto | Gonçalo Figueiredo fotografia

Entre as 16 freguesias alentejanas que se querem “divorciar” há processos mais avançados que outros, e alguns que poderão terminar em “reconciliação forçada”. Uns, como os de Amieira e Alqueva (Portel) ou Cortiçadas de Lavre e Lavre (Montemor-o-Novo), já chegaram ao Parlamento. Outros, como os de São Bento e Santa Vitória do Ameixial (Estremoz) ou de São Manços e Vendinha (Évora), ainda nem passaram pela Assembleia Municipal.

Não foi um “enlace” fácil o das freguesias de S. Manços e S. Vicente do Pigeiro (Vendinha), em Évora, imposto pelo Governo de Pedro Passos Coelho em 2011, estava o país sob intervenção da troika. Na altura, 1168 freguesias viram-se obrigadas a viver em “união de facto”. Entre elas, S. Manços e S. Vicente do Pigeiro. “Fizeram-se abaixo-assinados que em nada resultaram porque a decisão estava tomada. As populações não foram ouvidas, não pudemos manifestar a nossa opinião e foi complicado aceitar essa perda de identidade”, lembra Florinda Russo, presidente da União de Freguesias, acrescentando que passados 10 anos de vida em comum é chegada a hora da separação.

“Estamos a tratar do processo, já foi aprovado em Assembleia de Freguesia, está quase tudo concluído até à sua entrega, para deliberação, na Assembleia Municipal de Évora”, sublinha a autarca, acrescentando que apesar de não existirem problemas a nível de gestão, “não devemos perder a identidade” de cada terra, tanto mais que “as necessidade, a cultura e as tradições” são diferentes. 

Ao longo deste período, a União de Freguesias funcionou em dois edifícios: um em S. Manços, outro na Vendinha; e em cada local foi também criado um espaço cidadão, um dos projetos mais emblemáticos da Junta de Freguesia. “Deixámos ficar os serviços a funcionar em separado. Mas é verdade que cada freguesia conseguirá, por si só, dar melhor resposta às necessidades das populações”, garante Florinda Russo, sem esquecer que o “divórcio”, pelo menos por enquanto, não passa de uma intenção.

E de intenção poderá não passar. Primeiro, porque a Assembleia Municipal de Évora terá uma palavra decisiva. Depois, e talvez mais importante, porque o pedido para a desagregação da freguesia deveria ter dado entrada na Assembleia da República “dentro do prazo de um ano após a entrada em vigor” da lei, ou seja, até ao passado dia 21 de dezembro, o que não aconteceu.

Não aconteceu neste caso, como não aconteceu com outros, como São Bento e Santa Vitória do Ameixial, no concelho de Estremoz, cuja desagregação foi também aprovada em Assembleia de Freguesia, mas ainda não chegou à Assembleia Municipal. Entre os opositores do “divórcio” está o presidente da União de Freguesias, José Filipe Duarte: “A união destas duas freguesias foi votada numa [reunião de] Assembleia Municipal pelos então presidentes das juntas. Não pretendia que se voltasse atrás”. 

“A União não nos traz benefícios nenhum. Fui o primeiro a subscrever o abaixo-assinado [a exigir a separação]”, contrapõe João Cabaço, residente em São Bento do Ameixial. Para que esta aprovação ao nível da freguesia tenha consequência é necessário que vingue a interpretação da lei feita pela Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE), segundo a qual o prazo de um ano se refere ao início do processo e não à sua entrega no Parlamento. 

No mesmo sentido, o PCP apresentou uma proposta de alteração à lei, na qual “propõe o alargamento do prazo por mais um ano, para a entrada dos processos na Assembleia da República”, pois está a ser exigido o “cumprimento de um conjunto de critérios restritivos que impedem que muitas freguesias possam ser repostas, como defendem as populações e os respetivos órgãos autárquicos”.

Para apreciação dos deputados já estão diversos processos de desagregação, como os das Uniões de Freguesias de Amieira e Alqueva e de São Bartolomeu do Outeiro e Oriola, no concelho de Portel. “A identidade, a área e o número de eleitores justificam cada uma ter a sua autonomia”, disse à Lusa o presidente da Câmara de Portel, José Manuel Grilo, lembrando que cada terra tem uma “identidade própria” e está fisicamente “distante” da sua parceira de união. “Além disso, a poupança financeira não existiu e só não foi pior a governação destas freguesias porque nós mantivemos sempre as sedes abertas e ao serviço da população”.

Também no Parlamento está a desagregação da União de Freguesias de Vila Nova de São Bento e Vale de Vargo, aprovada por unanimidade e aclamação na Assembleia Municipal de Serpa, uma vez que a agregação “agravou a falta de meios para responder de forma atempada e efetiva, impactando negativamente no desenvolvimento social, coesão e identidade que se pretende para este território”.

“NÃO HOUVE BOM SENSO”

Vice-presidente do Núcleo de Portalegre da ANAFRE, António Simão carrega nas críticas ao processo que levou à criação das Uniões de Freguesias, considerando que “não houve bom senso” uma vez que as populações “não foram ouvidas” e que as decisões acabaram por ser tomadas “segundo uma opinião política, a dos presidentes de câmara”. E dá um exemplo: “Das duas freguesias [urbanas] de Portalegre passou-se para uma e em Castelo de Vide, na sede de concelho, com menos de três mil habitantes, mantêm-se em funcionamento três freguesias”. No Alto Alentejo há dois processos mais avançados, designadamente a desagregação das Uniões de Freguesia de Ribeira de Nisa e Carreiras (Portalegre) e de Terrugem e Vila Boim (Elvas).

“PRECISAMOS É DE MAIS MEIOS”

As duas maiores Uniões de Freguesias da região encontram-se em Évora. Tanto a Malagueira e Horta das Figueiras (21 mil habitantes) como o Bacelo e Senhora da Saúde (18 mil) deverão manter o “casamento” contraído há 10 anos. “O que esta Junta de Freguesia precisa é de mais recursos e isso consegue-se se a Câmara Municipal transferir mais competências. Se a Junta tiver mais recursos irá conseguir dar uma resposta mais célere e próxima das pessoas. Isso não se faz dividindo, mas dotando as Juntas de Freguesia de meios humanos e financeiros”, diz Luís Pardal, presidente da União de Freguesias do Bacelo e Senhora da Saúde.

Já Ananias Quintano, presidente da União de Freguesias da Malagueira e Horta das Figueiras, está convencido que“a maioria das pessoas será contra a desagregação das freguesias, talvez à exceção do próprio Bairro da Malagueira, embora não haja nenhum estudo sobre isso”. 

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