PUBLICIDADE

“Só o projeto para o Rossio custava quase meio milhão”

Luís Godinho (texto) e Gonçalo Figueiredo (fotografia)

Prossegue a polémica sobre a condenação do Município de Estremoz a pagar mais de 320 mil euros a um gabinete de arquitetura do Porto. De acordo com Nuno Rato, do MiETZ, só em projeto, o Executivo liderado pelo PS, em 2009, comprometeu a autarquia em mais de 470 mil euros (IVA incluído). A que se teriam de somar mais 120 mil euros pelas alterações pedidas.

O contrato assinado em julho de 2009 entre o Município de Estremoz e um gabinete de arquitetura do Porto – que não se encontra registado no portal BASE, onde se encontra centralizada a informação sobre os contratos públicos celebrados em Portugal – obrigava a autarquia ao pagamento de “quase meio milhão de euros”.

A revelação foi feita por Nuno Rato, vereador do Movimento Independente por Estremoz (MiETZ), em reunião de Câmara, durante uma análise política ao acórdão do Tribunal Arbitral, revelado em primeira mão pelo “Brados do Alentejo”, que condenou o Município ao pagamento de uma indemnização de mais de 320 mil euros ao gabinete de arquitetura.

“Esse projeto foi assinado a três meses das eleições autárquicas. O seu valor era de cerca de 385 mil euros mais IVA. O Município teria de pagar quase meio milhão de euros só para o projeto”, referiu Nuno Rato, lembrando que o assunto foi tema de “debate” nas eleições autárquicas desse ano, uma vez que as propostas de intervenção no Rossio Marquês de Pombal “não eram consensuais” na cidade. Em causa estava, designadamente, a construção de uma via que atravessava o Rossio e a demolição do antigo posto de viação.

As autárquicas de 2009 terminaram com a derrota do Executivo socialista. E com a vitória do MiETZ, liderado por Luís Mourinha, cujo chefe de gabinete, António Serrano, enviou em maio de 2010 uma comunicação ao gabinete de arquitetura do Porto na qual apresentava a posição do Município, pedindo que na “nova abordagem ao projeto” de requalificação do Rossio e largos adjacentes fosse contemplada a “eliminação da nova via que atravessa o espaço”, para manter a sua identidade “e as memórias coletivas” que lhe estão associadas.

“A criação desta via”, prosseguiu, “é também contrária àquilo que são os anseios da maioria da população estremocense que, desde a apresentação do projeto, sempre foi contra a sua implantação”, acrescentava a missiva.

“Tudo isso foi amplamente esgrimido na campanha eleitoral (…) era legitimo [ao novo Executivo], tal como os senhores fizeram, de seguir ou não seguir com estes projetos ou de propor alterações”, acrescentou Nuno Rato, sublinhando ter sido pago “à cabeça” 20% do valor do contrato e que a empresa de arquitetura pediu “mais 120 mil euros” para a realização das alterações ao projeto.

Conforme divulgado pelo “Brados do Alentejo”, o próprio acórdão do Tribunal Arbitral reconhece que “contratual e legalmente” era “lícito” ao Município introduzir estas modificações, mas sublinha que a partir de maio de 2010, altura em que foram “elencadas as diversas alterações pretendidas ao anteprojeto”, o Executivo municipal deixou de responder à empresa, num “silêncio concludente” até novembro de 2015 quando o então presidente, Luís Mourinha, enviou uma carta “dando como cessada” a vigência do contrato.

“Tem de concluir-se que esta intencionada ou pretendida modificação se traduziu, no plano prático-jurídico, numa rescisão/resolução unilateral do contrato”, considerou o Tribunal Arbitral, lembrando que o Município se havia “obrigado” a pagar à empresa “os honorários correspondentes às fases já entregues e aprovadas e as despesas comprovadamente realizadas”.

A empresa avançou para tribunal. Primeiro para o Administrativo e Fiscal de Beja, que se considerou “incompetente” para analisar o processo. Depois para um tribunal arbitral, onde o caso se arrastou durante vários anos até à tomada de decisão, em finais de agosto, que obriga o Município ao pagamento de uma verba superior a 320 mil euros.

“Não tenho que estar aqui a discutir a bondade ou legitimidade de quem decidiu lançar o concurso, estava no exercício de poder, foi votado, deliberado, houve um contrato feito nos termos da lei. Foram opções legítimas”, diz o presidente da Câmara de Estremoz, José Daniel Sádio, considerando ter existido uma “total e inexplicável irresponsabilidade” do anterior Executivo municipal.

“Comprovadamente, a Câmara não resolveu o contrato, não pagou e quis acionar garantias bancárias que existiam. Factos são factos”, prosseguiu o autarca, recordando que à data da tomada de posse desse Executivo existia “um contrato assinado e verbas comprometidas” para com o gabinete de arquitetura. “A minha esperança é que se consiga reverter [este acórdão] de alguma forma. Isso é uma questão de Direito. A factual está ali [expressa]”.

José Daniel Sádio reconhece que a situação “não é fácil”, uma vez que, de um ponto de vista jurídico, as decisões dos tribunais arbitrais não são suscetíveis de recurso. Ainda assim, revelou que a autarquia está a “analisar a possibilidade de contestar essa deliberação num tribunal comum”, o que parece ser o único caminho alternativo à decisão tomada pelos árbitros Licínio Lopes Martins (que presidiu), Manuel Serens e Gonçalo Nogueira.

“Iremos fazer tudo para fazer vingar os argumentos que foram tidos pelo Executivo à data”, prosseguiu o presidente da Câmara, segundo o qual “é muito grave” que o Município tenha de pagar esta verba “num processo que, à data, se cifrava no pagamento de cerca de 90 mil euros pelos trabalhos que foram pedidos para fazer alterações que não foram validadas” pela Câmara.

MUDANÇA DE ADVOGADO

Na reunião de Câmara, o vereador Nuno Rato disse ter ficado “espantado” quando soube que o advogado que representou o Município neste processo “ao longo de 10 anos” teve o seu contrato de avença rescindido pela autarquia, depois da tomada de posse do atual Executivo “Nenhum advogado altera os factos. Factos são factos”, contrapôs o presidente da Câmara, segundo o qual foi o próprio jurista a adverti-lo que este processo tinha “muitas fragilidades” por parte do Município.

Partilhar artigo:

FIQUE LIGADO

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE

© 2024 SUDOESTE Portugal. Todos os direitos reservados.

Desenvolvido por WebTech.