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Produtores pecuários “alarmados” com cortes nos apoios

Luís Godinho texto | Gonçalo Figueiredo fotografia

Ouvido na Comissão Parlamentar de Agricultura, o presidente da Apormor disse que a sustentabilidade da pecuária em regime de extensivo “está a bater no fundo” e criticou o anunciado corte de 30% nas ajudas comunitárias. Defendendo a demissão da ministra da Agricultura por “não ter perfil” para o cargo, Joaquim Capoulas entende que a nova Polícia Agrícola Comum, elaborada antes da pandemia e da guerra, “tem de ser reformulada” e lamentou que os agricultores se tenham transformado “numa espécie em vias de extinção”.

O presidente da Associação de Produtores do Mundo Rural da Região de Montemor-o-Novo (Apormor), Joaquim Capoulas, disse ter ficado “alarmado com os cortas nas ajudas” à pecuária extensiva determinados pelo Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC) que entrou em vigor em janeiro e irá regular os apoios comunitários até 2027.

“Mais um vez o setor da pecuária extensiva de sequeiro, o único que garante a ocupação do território durante todo o ano, faça chuva ou sol, haja pandemia ou não, saiu prejudicado tendo-lhe sido retiradas importantes ajudas em benefício de outras áreas que os mercados já melhor remuneram”, sublinhou Joaquim Capoulas numa audiência da Comissão Parlamentar de Agricultura.

De acordo com a vice-presidente da associação, Maria do Céu Salgueiro, só nos pagamentos diretos destinados a apoiar as práticas agrícolas benéficas para o clima e ambiente (conhecidos como greening), “há uma quebra de 30%” nas ajudas aos produtores pecuários. 

“Os apoios da seca ainda não chegaram, bem como as ajudas complementares no âmbito do aumento dos custos de produção. Fizemos a planificação da campanha para 2023, mas não sabemos se deveríamos fazer mais áreas, para ir buscar mais complemento de ajudas, porque não sabemos quais são as ajudas”, lamentou.

Segundo Joaquim Capoulas está em causa “a motivação” dos produtores pecuários para prosseguirem a atividade, o que poderá agravar o “abandono” do mundo rural.

“A sustentabilidade da produção pecuária está a bater no fundo. Talvez seja por isso que os preços da carne, de uma maneira geral, estão a subir, em contra-ciclo com a inflação que dá sinais de descer”, disse o dirigente da Apormor, lembrando a existência de uma “acentuada diminuição do número de vacas produtoras”, por um lado porque o atual efetivo “cresceu muito devido aos anteriores estímulos da PAC”, por outro porque “os custos da alimentação [animal] em período de carência [de pastos] são incomportáveis”.

Defendendo a necessidade de uma “reformulação total” do PEPAC, Joaquim Capoulas lembrou aos deputados que toda a programação deste ciclo de apoios comunitários foi decidida antes da pandemia de covid-19 e antes da guerra da Ucrânia, “como se a ordem mundial continuasse a ser a mesma, como se a questão da soberania alimentar não se colocasse”. 

Este foi um tema no qual insistiu: “há uma guerra na Europa que põe em causa o que a globalização dava por adquirido”, pelo que a excessiva dependência do país face aos circuitos de importação representa riscos acrescidos. “Nenhum país é verdadeiramente soberano e independente se não tiver garantias de arranjar comida para a população que o habita”.

Lembrando que nas zonas rurais foram recuperadas “práticas de subsistência de outrora, como o cultivo de hortas ou a criação de galinhas, coelhos e outras espécies mais fáceis de produzir”, alertou que, “a prosseguir o caminho traçado na atual versão” do PEPAC, “em que não foram ouvidas as associações de produtores”, o resultado será o “acentuar do abandono do território rural pelas gentes do campo”. O que é ainda mais grave tendo em conta que “as pessoas que fazem da vida do campo o seu ganha pão, lá permanecendo durante todo o ano, são as únicas sem as quais não será possível implementar medidas de conservação da natureza ou de desenvolvimento económico”.

DEMISSÃO DA MINISTRA

Entre as exigências dos agricultores está o pedido de demissão da ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes. “Não defende o setor, não tem perfil para o cargo”, acusou o presidente da Apormor, segundo o qual a agricultura “não é uma prioridade” para o atual Governo. “Se o fosse, sublinhou, “a titular da pasta não ocupava o último lugar na hierarquia do Governo”. 

À frente de um Ministério da Agricultura “forte, como pasta económica com grandes preocupações ambientais e que enquadre todos os setores do mundo rural de modo a permitir a sua gestão integrada e um ordenamento do território coerente”, quer ver alguém “com outro peso político”, que promova “o fim do processo de desmantelamento do Ministério e da passagem das respetivas direções regionais” para a tutela das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, “neste momento mais focadas em questões políticas e ambientais, ficando a economia geral e a preocupação com a sustentabilidade económica e social para segundo plano”.

Por fim, defendeu a “devolução das florestas ao seu devido lugar”, ou seja, à tutela da Agricultura – neste momento estão sob a alçada do Ambiente -, pois a floresta “só poderá exercer” o seu “papel ambiental fundamental” se estiver “associada a uma vertente económica, equilibrada e rentável. Se assim não for, na realidade, só servirá para arder de tempos a tempos por não haver ninguém que cuide dela”.

“O AGRICULTOR É UMA ESPÉCIE EM VIAS DE EXTINÇÃO”

Classificando o agricultores como “uma espécie em vias de extinção”, o presidente da Apormor sublinhou na Comissão Parlamentar de Agricultura que “os proprietários de terras têm-se tornado em senhorios que vivem de rendas”. E explicou: “As ajudas da PAC desligadas da produção funcionam como rendas”. Sendo que esta tendência se acertou nos últimos anos com o arrendamento de terras para a instalação de novas culturas intensivas. Arrendamentos feitos, “na maioria dos casos, a fundos financeiros, que tanto vêm como vão, quando as margens de negócio já não forem suficientes. E quem garante a ocupação e conservação dos ecossistemas rurais no futuro?”, interrogou Joaquim Capoulas.

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