Os cereais de inverno deverão registar uma diminuição generalizada das áreas semeadas ( menos 10% no trigo mole e menos 5% nos restantes cereais face à campanha anterior). A previsão é do Instituto Nacional de Estatística (INE). Quebra na produtividade agrava, ainda mais, a dependência externa.
Nas previsões agrícolas, agora divulgadas, o INE indica que a superfície cultivada com trigo em Portugal não ultrapassará os 23 mil hectares, menos dois mil hectares do que o ano passado, e uma das mais baixas de sempre. De igual forma, são também menores as áreas dedicas à produção de aveia, cevada, centeio e triticale, o que, na prática, representa o agravamento da dependência externa do país em matéria de cereais
Fonte do INE explica que as condições meteorológicas do início desta campanha, em particular o prolongamento do período de escassa precipitação e de baixo teor de água no solo, “não só dificultaram a realização dos trabalhos de preparação do solo/sementeira dos cereais de inverno (por reduzirem a janela de oportunidade de os instalar em condições agronomicamente aceitáveis), mas também aumentaram o risco de investimento em culturas de sequeiro”.
Por outro lado, a “forte subida do preço dos meios de produção contribuiu para agravar este cenário de incerteza, conduzindo à manutenção da tendência de redução da área destas culturas”, que nas últimas dez campanhas decresceu a uma taxa anual média de 3,8%.
Conforme noticiado pelo Brados do Alentejo, a invasão da Ucrânia pela Rússia, dois dos maiores produtores mundiais de cereais, veio trazer incerteza ao mercado. Ainda assim, o INE assinala o “peso pouco significativo” destes dois países na estrutura nacional de importações de trigo, abaixo dos 0,5 por cento, “pelo que a suspensão das importações diretas deste cereal a partir destes países não afetará esta cadeia de abastecimento”.
No entanto, prossegue a mesma fonte, num cenário em que as questões relativas à autossuficiência e segurança alimentar “adquirem uma importância crescente”, a instabilidade política “repercutiu-se nos mercados mundiais”, em particular no caso do trigo. Durante o mês de março, o preço deste cereal atingiu mesmo “máximos históricos” de 409 euros por tonelada.
Ao problema da diminuição da superfície cultivada soma-se a quebra na produtividade, explicada pelo “desenvolvimento muito condicionado” da cultura até finais de fevereiro, devido à seca. Na maioria dos casos, explica o INE, a precipitação de março “não alterou de forma relevante” o desenvolvimento das culturas, prevendo-se por isso baixas produtividades. Globalmente, preveem-se diminuições na produtividade das culturas cerealíferas, que atingirão os 20% na aveia e triticale, 15% no trigo e 10% no centeio.
“Havendo alternativas que dão mais rendimento, muita área [de cereais] foi substituída, por exemplo, por culturas permanentes. Como houve também um desinvestimento do Governo nesta área, nomeadamente, com o fim das ajudas ligadas à produção de cereais, houve muitos agricultores que optaram por deixar esta produção”, explica José Palha, presidente da Associação Nacional de Produtores de Cereais (Anpoc).
Da conjugação destes dois fatores (menos área cultivada e menos produtividade por hectare) resulta uma situação muito concreta: o país depende em mais de 90% por cento da importação de cereais. Esta é a quarta cultura agrícola com maior produção em Portugal: 1 milhão de toneladas em 2020. No entanto, já foi a principal com uma produção de 1,7 milhões de toneladas em 1986.