Pedro do Carmo, presidente da Comissão Parlamentar de Agricultura | Opinião
Proibir como asfixiar as opções dos cidadãos são formas de espiar os falhanços educacionais e formativos das sociedades. Num determinado equilíbrio podem fazer parte das regras de convivência dos indivíduos nas comunidades, do respeito pela esfera de liberdade dos outros, mas a estupidificação dos consumos e dos consumidores é o maior atestado de fracasso que pode existir.
A Irlanda avançou há anos com a ideia peregrina de querer colocar rótulos de choque nas embalagens de bebidas alcoólicas como já existe para o tabaco, os vorazes proibicionistas nacionais e europeus exultaram com mais um exercício de fustigação perante a incapacidade para sensibilizar as almas em relação aos excessos e a Comissão Europeia quer generalizar o moralismo gráfico.
É no excesso que está o problema do consumo de vinho, ao invés do que acontece no tabaco, em que tudo é mau no consumo. É por isso um disparate querer evidenciar os riscos dos excessos no consumo de bebidas alcoólicas com a colocação de rótulos com imagens choque de doentes e doenças resultantes dos desmandos.
De certa forma é uma espécie de regresso da instrumentalização propagandística do vinho, algo salazarenta em tempo democrático, com uma deriva de evolução do ‘Beber vinho é dar o pão a um milhão de portugueses’ para a aposição nas garrafas de imagens choque de doenças provocadas pelos excessos de consumo. A tudo isso dizemos não. O vinho é parte integrante da dieta mediterrânica, pilar importante da realidade rural de muitos territórios do país, fundamental para as dinâmicas das comunidades locais e relevante nas exportações nacionais.
Ao longo dos últimos anos, a fileira vitivinícola concretizou um esforço de qualificação dos diversos momentos do processo produtivo, da produção ao consumo, com uma enorme incorporação de valor no produto, em que os rótulos são um instrumento de afirmação. Muitos dos rótulos utilizados, além da informação de lei, são autênticas obras de arte, expressão das memórias, das identidades e do compromisso de afirmação da capacidade produtiva de um mundo rural demasiadas vezes sujeito ao preconceito, à ligeireza e a uma alegada modernidade de imposições que tomam toda a gente por estúpidos, sem capacidade de reconhecer os riscos das ações.
Depois deste esforço de valorização da capacidade produtiva e da geração de produtos com crescente qualidade em todas as regiões vinícolas era mesmo o que faltava que uns fundamentalistas nacionais e uns burocratas de Bruxelas ausentes da atenção e apoio ao setor face às dificuldades estruturais e conjunturais viessem perturbar a afirmação de um produto de excelência da dieta mediterrânica.
Nos últimos, antes da pandemia, a produção vinícola de Portugal tem crescido muito; a um ritmo de 3,3% por ano. O vinho representa cerca de 2,4% do total de exportações nacionais, podendo ter sido batido novo recorde de venda ao exterior em 2022
Os produtores e a produção de vinho são um importante ativo do país e da geração de dinâmicas positivas nos territórios rurais. A fileira fez e está a fazer o seu trabalho, com esforço e exigência, que outros façam o mesmo na educação e formação dos portugueses para o consumo. Se não é para ajudar, não atrapalhem. Deixem o mundo rural em paz. Rótulos choque no vinho, nem pensar.