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Memórias de Carnaval. Ou os fatos de uma vida dedicada à costura

Margarida Maneta texto | Gonçalo Figueiredo foto

Diz-se que a vida são dois dias, mas o Carnaval em Estremoz, este ano, dura um mês. Quem entrar pelo Posto de Turismo, até ao final de março, fica convencido de que, ainda que num formato diferente, a tradição carnavalesca é para cumprir. De palhaços, bobos da corte, turbantes como o de Carmen Miranda ou a dualidade verão e inverno, há uma exposição de fatos e adereços de anos anteriores que apontam para uma festa que se quer viva.

“Estamos para aqui a matar saudades do Carnaval”. Quem o diz é Palmira Batista, costureira estremocense que criou vários dos fatos agora em exibição. Rodeada de amigos e admiradores, aquando da inauguração da exposição “Memórias de Carnaval”, a costureira relembra que tudo começou como que “por brincadeira”. Brincadeira essa que dura até aos dias de hoje.

Por volta de 2005, pediram-lhe ajuda para fazer “uns dez fatos, se tanto”. Seguiram-se o que a costureira define como “muitos quilómetros de máquina”: muito mais de 50 fatos já lhe passaram pelas mãos.

Normalmente, conta com ajuda na parte dos adereços, para fazer “os pompons e as cabeças” das máscaras. No entanto, no que diz respeito aos fatos, Palmira Batista faz questão de os fazer, um por um, o que lhe exige tempo e dedicação. “Tenho de aproveitar todos os bocadinhos e começar com antecedência”, conta. 

As ideias que têm desfilado pelas ruas de Estremoz surgem uns meses antes, no decorrer de conversas em que “uns puxam pelos outros”. E a preparação inicia-se logo de seguida. “Começamos a planear os fatos entre setembro e outubro, para estarem prontos em fevereiro ou março”. Em contrarrelógio, todos os minutos contam. “Tenho de estar sempre a fazer alguma coisa”. 

O resultado final vai além dos tecidos e linhas entrelaçadas num fato vistoso. Reflete-se também nos sorrisos e nas gargalhadas de quem desfila, por umas horas, o trabalho de vários meses. “As pessoas gostam de nos ver. É o que ouvimos na rua por aqueles dias e também na semana seguinte”, afirma a costureira ao Brados do Alentejo, confessando-se realizada.

Palmira Batista

“O MEU FATO FAVORITO… SÃO TODOS”

Para Palmira Batista, não há um fato mais bonito que o outro. Todos são especiais, sendo “cada um de sua maneira”. Em casa, a costureira tem um armário só para os fatos de Carnaval e outro para cabeças e restantes acessórios. “É para não se estragarem”. E tem tido sucesso nessa preservação: “Tenho fatos de 2006 que ainda estão impecáveis”. Alguns deles passaram de geração em geração. “O Carnaval não tem idade”, acredita a costureira. E acrescenta: “Até carrinhos de bebé já enfeitei”. 

O difícil mesmo é escolher. “Quando os comecei a tirar [os fatos] do roupeiro para trazer para a exposição pensei: e agora, qual levo?”. Segundo diz: “O meu fato favorito são… todos”. A sua ideia para este ano, desvenda, “era desfilarmos com os fatos que já tínhamos” em pequenos grupos. Diga-se, expor as máscaras, mas fora de quatro paredes. A exposição, patente ao público no posto de turismo, foi a celebração possível.

Palmira Batista começou a coser com apenas 10 anos de idade, altura em que frequentava o ensino primário. Da escola saía direta para a costura. Até que saiu de vez… da escola, porque da costura seria incapaz. A sua história de vida está intimamente às linhas, tecidos e agulhas que lhe preenchem os dias. “Sempre gostei do Carnaval”. Por isso, divertia-se a preparar fatos e acessórios que enchiam o corso carnavalesco em Estremoz de cor e de purpurinas, mas ficava sempre entre a multidão a aplaudir. “Parece que não tinha coragem” de se juntar aos mascarados, revela. Além disso, “o meu marido não gostava muito e eu não o queria deixar sozinho”. 

Mas o entusiasmo dos participantes cativava quem os rodeava: “Estavam sempre a puxar por mim a dizer que também devia ir”. Até que um dia, bem perto da hora do desfile, houve uma desistência. E Palmira Batista passou de costureira a mascarada: “Vesti o fato e ele estava-me impecável. Senti-me lindamente e pensei: agora mesmo que quisesse desistir, já não conseguia”. 

Foi quanto bastou para perder “as vergonhas todas” e arrastar o marido. “Agora ele já veste os fatos e gosta tanto como eu”, diz entre gargalhadas. Mesmo que quisesse abrandar, a paixão pelo Carnaval não esmorece.

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