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“Magnético”, uma noite na história “de gente humilde”

Luís Godinho texto | Carolina Lecoq fotografia

Peça escrita e encenada por Abel Neves, um dos nomes grandes da dramaturgia contemporânea portuguesa, “Magnético” está em cena do Teatro Garcia de Resende até ao próximo dia 12 de março. Trata-se da primeira produção deste ano do Centro Dramático de Évora. 

É na noite, “onde as estrelas mentem luz”, na expressão de Fernando Pessoa, que a ação de “Magnético” se desenrola. Peça escrita e encenada por Abel Neves, em cena do Teatro Garcia de Resende até ao próximo dia 12 de março, conta a história de dois casais que não se conhecem [Oliveira e Marina, Dulce e Adriano], cujos carros deixam de trabalhar numa estrada sem movimento. 

Esse tempo de paragem, saberemos pouco depois, não se terá ficado a dever à falta de gasolina, embora essa tenha sido a primeiro impressão de quem conduzia os automóveis. Sabe-se lá porque deixaram de funcionar.! Talvez pelo magnetismo de antigas minas que funcionaram nessa zona de serra, talvez por qualquer outro fenómeno que tenha ocorrido. A aldeia mais próxima fica a 40 quilómetros de distância, ou talvez a 10.

À primeira vista ter-se-á tratado de falta de combustível e é isso que leva os dois casais a encontrarem-se de forma inusitada numa “estação de serviço”, ali à beira da estrada, que se encontra desativada há vários anos. Não há gasolina, mas o espaço é habitado por dois irmãos [Raposo e Mateus], homens solitários, tão “enigmáticos quanto a própria vida”.

Nessa noite, num lugar inóspito formado por uma velha bomba de gasolina e por uma cabana, também muito consumida, a vida acontece ao sabor do enigma. Razão e sentidos enlaçam-se em capricho e, até com humor, e tanto podem inquietar como esclarecer. Natureza e humanidade: que força tem o amor?

“É uma peça simples, que nos confronta com situações um pouco bizarras”, diz José Russo, ator e diretor do Centro Dramático de Évora (Cendrev), acrescentando tratar-se de uma “história de gente humilde, que se confronta com situações de que não está à espera, uma história um pouco desconcertante, com algumas coisas de tristeza, outras de amor, pois passam por ali várias situações dessa natureza”.

A chegada da autoestrada alterou a vida das pessoas que habitavam aquele espaço. A velha estrada deixou de ter movimento. A estação de serviço já não tem combustível, nem café. Num local onde havia vida, “que resultava da circulação normal e regular de pessoas”, restam as memórias e as vivências de quem se recusa a abandonar o espaço. Como os dois irmãos, filhos do falecido Raposo, o antigo proprietário das bombas. 

Um deles, conhecemo-lo primeiro, é construtor de muros. E dele pouco mais haveremos de saber, exceto na dimensão de amor que sente pelo irmão, um homem que regressou a casa traumatizado da guerra. “Magnético” convoca-nos para um confronto com os medos que se escondem na noite e na rejeição da diferença.

“Os dois irmãos habitam ali, tranquilamente, um espaço que vai ser ocupado por aquelas pessoas que vêm á procura do que lá não há, de gasolina, e isso desencadeia um conjunto de pequenos episódios, pequenas histórias, de acordo com a natureza e atividades que os casais desenvolvem na sua vida e que trazem para ali”, resume José Russo, desvendado que ao longo da peça “as coisas arrastam-se, sem solução, enquanto a noite se vai prolongando”. 

Um dos casais está em lua de mel, e de repente, de forma inesperada, a figura feminina desse casal “confronta-se com as pessoas que habitam” aquele espaço. “Há um frisson qualquer entre ela e um dos irmãos que habitam aquele espaço”. Será a aceitação da diferença ou a descoberta do amor? 

“Trata-se de um texto muito poético, muito interessante, muito profundo que mostra a vida dessas pessoas fora do seu habitat habitual. Há sons, há luz, é noite e essas condições também nos provocam reações, pois não estamos da mesma maneira num espaço que não conhecemos durante o dia ou à noite, período em que pequenas situações podem ganhar proporções maiores”, lembra José Russo.

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