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Imaterial. Um festival em Évora que reflete “sobre as nossas dores”

Ana Luísa Delgado texto

Diz a organização que o Imaterial, a decorrer em Évora entre os próximos dias 19 e 27 de maio, nos leva “ao encontro de novas formas de nos pensarmos como coletivo”. Carlos Seixas, o diretor artístico, é ainda mais ambicioso. Por aqui, garante, passam “as nossas dores e as nossas tragédias”, mas também “as nossas lutas pela liberdade e pela paz”. Sejam bem-vindos.

Não sendo apenas um festival de música, estando a música na sua essência, sendo também, mas não só, uma plataforma de pensamento e de debate sobre a sociedade contemporânea, o Imaterial foi concebido como uma “aposta na diversidade cultural”, diz o diretor artístico, Carlos Seixas, sublinhando a preocupação em dar uma “atenção particular à música tradicional dos povos, sobretudo às que se relacionam com rituais, cerimónias”, ou seja, que integram um património já não é geograficamente circunscrito, antes integrado no que se pode definir como “da Humanidade”. Tenha ou não selo de certificação pela Unesco ou por qualquer outra entidade.

Por isso, diz, “vamos ter por aqui representantes atuais daqueles que não deixam esquecer essas músicas, das polifonias que se espalharam por todo o Mediterrâneo, de África, que mantêm a história dos povos”. Que é também uma parte significativa da nossa história coletiva, do património imaterial que nos une. “Músicas do mundo são todos”, sublinha Carlos Seixas, acrescentando que este festival, promovido pela Câmara de Évora e pela Fundação Inatel, é “um pouco mais específico”, pretendendo “dar visibilidade” a registos sonoros que “normalmente não têm acesso” a este tipo de palcos, e que aqui podem “mostrar, cantar e tocar o que faz parte das suas próprias raízes”.

Haverá música, muita música como adiante se dirá. Mas também “discussões académicas” sobre esta nossa aventura comum. Querem um exemplo? No próximo domingo, dia 21, pelas 16h00, o programa inclui uma conversa de Catarina Laranjeiro e José Neves, investigadores do Instituto de História Contemporânea, sobre “Cuba a Cuba: Do Alentejo ao Caribe”, que abordará a viagem que Amílcar Cabral iniciou em Cuba no início dos anos 50, antes ainda de assumir um papel relevante na luta contra o império colonial português. É uma conversa onde serão exibidos documentos, fotografias e filmes de arquivo e que se propõe ser uma “viagem transnacional” pela segunda metade do século XX.

Na véspera, dia 20, o historiador Sanjay Seth, diretor do Centro de Estudos Pós Coloniais da universidade inglesa de Goldsmiths, irá abordar os desafios que a música, a arte ou a ciência colocam à disciplina da História e a alguns dos seus pressupostos fundamentais, seguindo-se um debate com o musicólogo João Pedro Cachopo, a historiadora de arte Mariana Pinto dos Santos e o historiador Luís Trindade.

“Entendemos que o Imaterial deve ser um ponto de partida para discussões académicas sobre o que se passa no património imaterial ou edificado, produzindo pensamento”, refere Carlos Seixas, destacando ainda uma conversa de Amílcar Vasques Dias, João Matias e Patrícia Portela, moderada por Gonçalo Frota, sobre “O Cante como Lugar de Futuro” (dia 24) e a apresentação da “Inscrição das Culturas Crioulas no Património Cultural Imaterial da Humanidade da UNESCO” (dia 26), a cargo de uma delegação das ilhas Seychelles. 

Segundo o diretor artístico do Festival, trata-se de uma “reflexão não só importante para Évora, futura Capital Europeia da Cultura, mas também para o que se passa no mundo, para a nossa cultura, as nossas dores e tragédias, mas também as nossas lutas pela liberdade e pela paz”. Num certame com objetivos ambiciosos a uma escala global: “Acreditamos que através do conhecimento do outro as pessoas podem viver mais em paz neste mundo tão trágico, que aprendemos e construímos o nosso futuro coletivo através das culturas populares, das histórias ancestrais”.

A 27 de maio, o Imaterial irá encerrar no Teatro Garcia de Resende com um espetáculo que juntará em palco Os Ganhões de Castro Verde e Paulo Ribeiro, músico que junto às modas do cancioneiro tradicional um conjunto de novas composições a partir de poemas de Manuel da Fonseca, João Monge, Tiago Rodrigues ou Patrícia Portela, numa perspetiva de renovação do repertório do Cante, “trazendo novos olhares sobre uma música que é Património Cultural e Imaterial da Humanidade”.

Todos os dias, pelo mesmo palco, irão desfilar diversas propostas musicais. A excepção será o concerto de estreia, com Huelgas Ensemble (dia 19), na Sé de Évora, que propõe “interpretações historicamente informadas” de peças corais do período medieval e do Renascimento. Destaque ainda para a atuação de Ana Lua Caiano (dia 20), “exemplo claro de como a tradição reiventada pode ser contagiada por assuntos dos nossos dias”, que apresenta o seu segundo álbum “Se Dançar É Só Depois”, e para os concertos de Kaito Winse (dia 23), “veículo de uma inspiradora riqueza poética e de uma filigrana na qual é possível escutar uma qualidade quase operática”, e dos Kayhan Kalhor Trio, “um dos mais reconhecidos representantes globais da cultura iraniana”, comprometidos com a música clássica persa.

“PARTILHA DE SONHOS COLETIVOS”

“A música tem destas coisas. Une e partilha sonhos coletivos, desafia a humanidade a ser mais solidária e a enfrentar as dificuldades com mais esperança. Denuncia e alerta para as injustiças. Mas também torna as pessoas cúmplices e ligadas para a vida inteira”, diz Carlos Seixas.

Já para o presidente da Câmara de Évora, Carlos Pinto de Sá, o Imaterial “é especialmente importante” nos anos que antecedem a 2027, em que a cidade será Capital Europeia da Cultura, pois “está em perfeita consonância com o conceito da candidatura apresentada”

OUTRAS MÚSICAS

Silvana Estrada estará em Évora a 25 de maio. Vencedora do Grammy Revelação em 2022, trata-se de “uma das mais apaixonantes” criadoras mexicanas. A que se seguirá, no mesmo dia e no mesmo palco, o Teatro Garcia de Resende, um concerto de La Kaita, cantora cigana nascida em Badajoz. “É uma das mais respeitadas vozes do flamenco tradicional, trazendo para a sua música jaleos e tangos, géneros típicos da Extremadura espanhola”. Évora será ainda o local do reencontro de La Kaita com o cineasta Tony Gatlif, “que foi um dos muitos a deslumbrar-se “com esse atalho que La Kaita encontra para as emoções de quem a ouve”, chamando-a para os filmes “Vengo” e “Latcho Drom”.

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