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Governo alarga período de caça para controlar população de javalis

Luís Godinho texto

Uma alteração à Lei da Caça, anunciada no Parlamento pelo secretário de Estado da Conservação da Natureza e das Florestas, vai permitir realizar esperas ao javali durante todos os dias. A ideia é duplicar o número de exemplares caçados, para controlar o crescimento da espécie. Mas a redução do número de caçadores pode comprometer as contas. E os agricultores dizem ter sido esquecidos.

De acordo com o secretário de Estado da Conservação da Natureza e das Florestas, João Paulo Catarino, o Governo vai aproveitar uma revisão à Lei da Caça, “para transpor regulamentação comunitária que proíbe a utilização de munições com chumbo nas zonas húmidas”, e alargar o período de caça ao javali pelo processo de espera. “Poderá passar a ser feito todos os dias e não apenas no período de lua cheia como atualmente acontece”, referiu o governante, na única medida concreta que apresentou para tentar controlar a população de javali.

Um estudo da Universidade de Aveiro, pago pelo Fundo Ambiental e agora divulgado, revelou que o número de javalis em Portugal se situa entre os 300 e os 400 mil exemplares, uma “população superabundante” sobretudo nas regiões do Alentejo, Beira Interior e Trás-os-Montes, e “particularmente relevante” em zonas agrícolas e na periferia dos aglomerados populacionais, territórios onde encontram “maior disponibilidade” de recursos alimentares.

“Este trabalho vem colmatar uma lacuna existente em termos de conhecimento da dinâmica das populações de javali e a sua implementação será um relevante instrumento, especialmente tendo em conta os desafios ecológicos e sanitários emergentes”, acrescentou o secretário de Estado, segundo o qual as conclusões do estudo, que irão ser agora avaliadas pelo Instituto de Conservação da Natureza e da Floresta (ICNF), “apontam” para a existência de uma “taxa de extração” [abate] média anual de 10%, sendo proposto o seu “incremento” para o dobro, “no espaço de cinco a 10 anos, com reavaliações regulares”.

“Como forma de reverter esta tendência, tendo em vista a compatibilização da presença do javali com o contexto ecológico, sanitário e socioeconómico envolvente, o documento sugere uma combinação de diferentes abordagens desde a limitação temporal do período de disponibilização alimentar em cevadouro ao aumento da taxa de extração anual e à aplicação de um maior esforço no primeiro trimestre do período venatório”, revelou João Paulo Catarino, ouvido pelos deputados na Comissão Parlamentar de Agricultura e Pescas.

Ainda de acordo com o governante, “a expansão das populações de javali em áreas urbanas e periurbanas” constitui “um fenómeno preocupante”, tal como “os danos que estas populações provocam em culturas agrícolas e florestais”. Mas aqui, apesar de várias vezes incitado pelos deputados e esclarecer com que tipo de apoios poderão os agricultores contar, o secretário de Estado limitou-se a antecipar a possibilidade de apoio a “investimentos na proteção das áreas agrícolas”, e a falar com a Comissão Europeia para que os danos provocados nas explorações, atualmente a cargo das concessionárias das zonas de caça, “possam ser considerados em seguro de colheita”.

Acresce que a intenção de resolver o problema da sobrepopulação de javali apenas com o aumento da possibilidade de caça enfrente mais um, aliás dois, problemas, identificados pelo deputado socialista Norberto Patinho: “A diminuição do número de caçadores e o seu envelhecimento”.

Segundo o secretário de Estado, os caçadores portugueses são “cada vez menos e estão mais envelhecidos”, pelo que defendeu a importância de “rejuvenescer” a atividade, sem também aqui adiantar medidas concretas, sublinhando apenas que “o javali veio provar a necessidade do ato venatório para fazer o equilíbrio dos ecossistemas”.

“ESTÃO A PASSAR AO LADO”

“As únicas medidas anunciadas estão relacionadas com a flexibilização da caça”, lamenta a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), acusando o Governo de “passar ao lado do grave problema que se arrasta há muito tempo e que atinge de forma muito significativa as produções agrícolas, principalmente dos pequenos e médios agricultores”.

Fonte da CNA recorda “os enormes prejuízos” causados pelos javalis que “têm devastado produções hortícolas, milharais, outras searas de cereais, estufas, olivais e vinhas”, acusando o Ministério da Agricultura de “se recusar a assumir compromissos de pagamento das indemnizações devidas” aos agricultores.

“O estudo atesta a dimensão do problema e um descontrolo total, que o ICNF e os sucessivos Governos têm tentado ignorar, e, mesmo agora, continuam a não tomar medidas adequadas e eficazes, como a indispensável mobilização de meios públicos”, acrescenta.

Entre as medidas reclama- das pela CNA inclui-se a “garantia da atribuição de indemnizações, de forma expedita e desburocratizada” aos agricultores lesados e o controlo da densidade e da mobilidade dos javalis, pelo que “recomenda a elaboração urgente mas participada de planos públicos de contingência”, a executar pelo Ministério do Ambiente.

“SÃO UM EXPRESSIVO PROBLEMA ECONÓMICO E SOCIAL”

“Quem vive no interior do país”, disse o deputado socialista Norberto Patinho, “tem perfeita consciência dos problemas causados pelos javalis”, uma espécie “resiliente, oportunista e omnívora que não despreza as várias fontes de alimento” e que se adapta “muito facilmente” a novos ambientes, reproduzindo-se de forma rápida. “Não tendo predadores naturais, é normal que a sua população aumente de ano após ano”, lembrou Norberto Patinho, acrescentando que, por isso, constituem “expressivo problema económico e social, e por vezes ecológico e sanitário”. O deputado socialista eleito pelo círculo de Évora recordou ainda que os prejuízos relatados pelos agricultores “têm vindo a aumentar consideravelmente nos últimos anos” e alertou para a importância de “minimizar” riscos, como a da ocorrência de casos de peste suína africana, transmitida pelos javalis. “Embora ainda sem casos registados na Península Ibérica, o ressurgimento da peste suína africana na Europa é uma preocupação para Portugal devido ao impacto catastrófico que teria na suinicultura”, concluiu.

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