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De muitos azulejos se faz um painel, destes um património único

Que a azulejaria é um dos mais preciosos tesouros de Estremoz ninguém tem dúvidas, ainda que continue a ser desconhecido de muitos. Para o divulgar há um novo livro, da autoria de Elisabete Pimentel. Luís Godinho (texto)

São as rosas, Senhor, as rosas, que saltam à vista na escadaria de acesso à Capela da Rainha Santa, em Estremoz. Uma alusão, claro, ao célebre milagre da Rainha Santa Isabel, aqui acompanhadas por estrelas de oito pontas, “referência às oito beatitudes”. E também um dos muitos tesouros da azulejaria estremocense, estudados por Elisabete Pimentel, que constituem a essência do livro agora lançado.

“Património Azulejar de Estremoz” reúne três monografias, respetivamente sobre a Capela da Rainha Santa Isabel, a Capela de Nossa Senhora dos Mártires e a Igreja de Nossa Senhora da Consolação”. E dá-se a circunstância de Elisabete Pimentel, membro do Grupo Cidade – Cidadãos pela Defesa do Património de Estremoz, ter não só formação em Letras e História, como também ter experiência em criação artística, incluindo painéis decorativos de azulejos.

“É do sentir deste património e da necessidade de chamarmos a atenção para ele, dando-o a conhecer melhor, mostrando-o, contando a sua história, sobretudo aos mais novos, aos jovens para que o valorizem e o protejam. É deste sentir que nasce a ideia deste livro”, escreve a autora no texto introdutório de uma obra editada pela Húmus, e cuja capa é a reprodução de um painel de azulejos representando as Bodas de Canã.

Já iremos à Capela de Nossa Senhora dos Mártires, onde este painel se encontra, mas por enquanto continuemos pela da Rainha Santa, Monumento Nacional desde 1910, mandada construir por D. Teodósio de Bragança, filho primogénito do rei D. João IV e de D. Luísa de Gusmão, nascido em Vila Viçosa a 8 de fevereiro de 1634, estava Portugal sob domínio filipino.

A Teodósio não faltavam títulos de nobreza, Duque de Bragança, Duque e Conde de Barcelos, Marquês de Vila Viçosa e, entre outros, Príncipe do Brasil, título criado em sua honra. Títulos e honrarias havia muitas, o pior era mesmo a saúde, frágil desde a meninice. Aos 19 anos é atingido por uma tuberculose pulmonar, que lhe haveria de custar a vida.

“Ciente de que o fim estava próximo (1653), pede a sua mãe (…) que construís- se uma capela em honra da Rainha Santa”, escreve Elisabete Pimentel, lembrando que Cosme III de Médicis, senhor do reino mais longo da Toscana, andou por Portugal em 1669 tendo trazido Pier Maria Baldi, arquiteto, pintor e cronista, “que nos seus escritos faz referência à capela do castelo” de Estremoz.

“Estaria nesta altura a capela já acabada?”, interroga a autora, não sem assinalar que em 1680 ainda havia obras, a cargo do padre Francisco Tinoco da Silva, que em finais do século XVII “uma grande explosão nos armazéns de guerra, a que se seguiu um violento incêndio”, deixou em ruínas “grande parte do burgo medieval”, tendo a reedificação da capela sido ordenada por D. Pedro II, o irmão mais novo do desafortunado Teodósio.

Os painéis de azulejos, da autoria de Teotónio Santos, são de uma extraordinária riqueza artística e histórica. “Os principais”, assinala Elisabete Pimentel, “relatam as lendas-milagres que se contam da Rainha”.

Entre eles está um “historiado” que nos remete para 1332. Reza a História que o rei D. Dinis teria uma certa preferência por um filho bastardo, D. Afonso Sanches, o que levou o futuro D. Afonso IV a rebelar-se contra o pai. Quando as tropas do rei, então já com mais de 60 anos, e as do filho D. Afonso estavam prestes a entrar em confronto, ali para os lados onde hoje se situa o bairro de Alvalade (Lisboa), eis que surge a rainha montada numa pequena mula e as pazes acabam por ser feitas.

No painel da capela não surge a mula, lá estando, no entanto, a Rainha Santa, uma “figura feminina coroada, mas com os trajes simples das Clarissas, numa atitude de diálogo e pacificação”.

Da Capela de Nossa Senhora dos Mártires, cujos painéis de azulejos são atribuídos ao pintor lisboeta Domingos de Almeida, a autora assinala que estes representam “passos fundamentais da vida de Maria Nossa Senhora, e episódios da vida de Jesus, numa estética barroca, destinada a ensinar, deleitar e comover”. Lá estando, claro, um alusivo às Bodas de Canã, o tal episódio em que Jesus transforma a água em vinho, por sinal “muito semelhante” a um outro painel que hoje se encontra no Museu Berardo de Estremoz.

No terceiro capítulo do livro, Elisabete Pimentel conduz-nos pela Igreja de Nossa Senhora da Consolação [Agostinhos], ao encontro de um “conjunto notável” de azulejos da oficina de António de Oliveira Bernardes, com referências à vida de Santo Agostinho, o “santo doutor”.

UM “TESOURO” DE ESTREMOZ

A azulejaria “é um tesouro que temos guardado e que necessitamos mostrar a quem nos visita, mas principalmente aos habitantes desta terra”, escreve o presidente da Câmara de Estremoz, José Daniel Sádio, no prefácio do livro, que conta com o apoio do Município. Lembrando que “muitos estremocenses desconhecem, em grande medida, esta riqueza que apesar de estar à vista de todos tem sido amplamente ignorada”, o autarca diz ser “importante contrariar esta fatalidade”, pois “não podemos conservar aquilo que não conhecemos”. Com esta edição, acrescenta José Daniel Sádio, “a historiografia de Estremoz fica mais rica”, tal como “o conhecimento geral sobre a importância do azulejo no concelho”.

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