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Casal vítima de acidente espera seis anos por indemnização

Luís Godinho texto

Foram precisos seis anos para a justiça atribuir uma indemnização a um casal que sofreu graves ferimentos  num acidente de viação perto de Alcácer do Sal. A companhia de seguros recusou pagar o valor pedido. O caso arrastou-se nos tribunais e ainda poderá não ter ficado “fechado” com a decisão do Tribunal da Relação de Évora.

As férias aproximavam-se do fim. Nesse final de tarde do dia 2 de setembro, o casal rumava com a filha de oito anos em direção a Lisboa quando, próximo de Alcácer do Sal, a autocaravana onde seguiam foi envolvida num violento acidente de viação. Um carro que circulava em sentido contrário, na Estrada Nacional 5, deu uma guinada repentina à esquerda, ultrapassou o traço contínuo e embateu chocou de frente com a autocaravana.

Como provavelmente ocorrerá em todos os acidentes, também este continua, em larga medida, por explicar. Tudo aconteceu num final de tarde com bom tempo, boa visibilidade, numa zona de reta com três faixas de rodagem. A autocaravana entre em despiste, sai da estrada e a acaba imobilizado fora da via, numa ravina. A estrada esteve cortada durante vários horas.

Do acidente resultou a morte dos dois ocupantes da viatura que entrou em despiste, “um casal com cerca de 60 anos”, conforme relatou na altura a GNR. A que se somam dois feridos, assistidos no local pelo Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) e posteriormente levados para o Hospital do Litoral Alentejano, em Santiago do Cacém.

Na sequência do choque, provar-se-ia em tribunal, o condutor da autocaravana desmaiou, “acordou com os gritos da esposa”, mas voltou a “perder o conhecimento por força das dores que estava a sentir”. O seu desencarceramento do interior da viatura demorou cerca de duas horas, durante as quais foi-lhe necessário administrar morfina “para controlo” das dores.

Deu entrada no hospital “com amnésia, apneico e imobilizado por suspeita de fratura do fémur e com colar cervical”. Ser-lhe-iam diagnosticadas diversas lesões, “multitraumatismos pelo corpo, designadamente ao nível da perna direita, tórax e cabeça”, além de inúmeras escoriações e hematomas, que obrigaram a uma intervenção cirúrgica e a diversos tratamentos. O internamento hospitalar, primeiro em Santiago do Cacém, depois em Penafiel, prolongou-se por dois meses. Os tratamentos, incluindo a fisioterapia, arrastaram-se por mais de um ano.

Quando o caso chegou pela primeira vez a tribunal, em 2018, ainda apresentava perda de equilíbrio, dificuldades na condução automóvel – “era seu hábito passear com a família quase todos os fins de semana, o que não mais logrou fazer” -, deixou de conseguir correr ou andar de bicicleta, obrigando-o a pôr de lado as caminhadas e os passeios de BTT, deixou de conviver com os amigos, “tornou-se uma pessoa ansiosa e intolerante”.

Igualmente ferida no acidente, com “hematoma frontal e craniano, contusão da anca e contusão cervical”, a mulher foi igualmente assistida no hospital, tendo sofrido um “grave choque emocional pela vivência traumática” do acidente, “pois percebeu a iminência do embate, o encarceramento do marido, a situação da filha no meio dos destroços, a morte da cadela de estimação”. Um quadro descrito pelo tribunal como de “distúrbio de stress pós traumático”, que lhe provocou, por exemplo, “distúrbios graves do sono”, perturbação da memória, pesadelos frequentes e um “estado depressivo permanente”, que a obrigou a tratamento psiquiátrico.

Com a morte do casal, a responsabilidade pela indemnização passou integralmente para a companhia de seguros. E o caso começou a arrastar-se em tribunal. Embora “admitindo a responsabilidade do seu segurado na produção do embate, assumindo que o mesmo foi violento”, a companhia considerou não ser “de atender à grande maioria dos danos invocados”, uma vez que “não são consequência do acidente e/ou estão exageradamente elencados”. O casal pedia mais de 200 mil euros de indemnização. A seguradora “chegou-se à frente” com cerca de 35 mil euros para compensar os “período de incapacidade” e as despesas médicas das vítimas. O processo acabou em tribunal.

Numa primeira decisão, o tribunal condenou a companhia de seguros a pagar ao casal uma indemnização de cerca de 240 mil euros, acrescidos de mais 33 mil pela destruição da autocaravana. A segura decidiu, então, recorrer para o Tribunal da Relação de Évora argumentando “não ter ficado provado” que o “défice funcional” das vítimas atingisse “de modo direto e imediato, a sua capacidade de ganho” e invocando outras decisões, de montante substancialmente inferior. 

“[O tribunal] afastou-se, de modo substancial e injustificado, dos critérios ou padrões que generalizadamente se entende deverem ser adotados, numa jurisprudência evolutiva e atualística, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da necessidade de adoção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados”, acrescentou a companhia, no recurso apresentado.

Analisado o caso, os desembargadores da Relação de Évora analisaram os argumentos das partes e reduziram o valor da indemnização, fixando-o agora em 155 mil euros. Inferior ao do tribunal de primeira instância. Mas a ser pago pela seguradora. A não ser que um outro recurso, agora para o Supremo, mantenha em “aberto” um problema que se prolonga há cerca de seis anos.

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