A Câmara de Estremoz aprovou um contrato de arrendamento por 10 anos que obriga o município a pagar uma renda de 4000 euros por mês. Para ser válida, a decisão, que está a motivar polémica, terá ainda de ser ratificada na Assembleia Municipal.
Luís Godinho (texto) e Gonçalo Figueiredo (fotografia)
A proposta foi levada à reunião de Câmara pela vice-presidente, Sónia Caldeia, e aprovada com os votos a favor do PS, a abstenção dos vereadores do Movimento Independente por Estremoz (MiETZ) e o voto contra da Coligação Estremoz com Futuro, liderada pelo PSD. Se “passar” na Assembleia Municipal, o município de Estremoz irá comprometer-se com o pagamento de 4000 euros mensais durante 10 anos pelo arrendamento do rés-do-chão do edifício junto à Rotunda do Combatente, onde funcionaram agências do BNU e da Caixa Geral de Depósitos. Será um compromisso de 480 mil euros em rendas.
Segundo Sónia Caldeira, “há uma necessidade evidente de aumentar o número de espaços, essenciais ao bom funcionamento quer do Serviço de Ação Social quer do Serviço de Atendimento e Acompanhamento Social”, pelo que este contrato de arrendamento constitui “uma solução de inegável oportunidade para melhorar e ampliar as condições de trabalho dos colaboradores municipais e de atendimento aos munícipes”.
Mais, acrescenta a vice-presidente, “da prospeção de mercado efetuada é notório que dada a área do imóvel e a sua localização, no centro na cidade e próximo do edifício dos Paços do Concelho, encontra-se dentro dos valores do mercado de arrendamento e permitirá dignificar os serviços municipais a instalar naquele espaço”.
A ideia é transferir para este edifício um conjunto de cinco funcionários municipais, a que somarão mais quatro, entre os quais os afetos ao projeto “Radar Social” e ao Contrato Local de Desenvolvimento Social (CLDS), destinado a “promover a inclusão social de grupos populacionais que revelem maiores níveis de fragilidade social”. Lembrando que o setor de Ação Social tem funcionado nas instalações do Centro Cultural Dr.º Marques Crespo, em conjunto com o arquivo municipal, academia sénior e diversas associações culturais e desportivas, Sónia Caldeira refere que a despesa com o arrendamento será efetuada com recurso a verbas transferidas pelo Estado para o Município no âmbito da descentralização de competências na área social.
“Somos sensíveis às dificuldades com que, todos os dias, os trabalhadores do município se confrontam”, diz Sónia Ramos, vereadora da Coligação Estremoz com Futuro, liderada pelo PSD, acrescentando que isso “não justifica remendos, soluções transitórias, excessivas, do ponto de vista financeiro e, para mais, lesivas, do nosso ponto de vista, para o erário público”.
A autarca sublinha que com a celebração deste contrato “o município vai assumir um encargo desproporcional, do ponto de vista financeiro e político, muito além do [atual] mandato político”, não tendo “acautelado” a possibilidade de futuros executivos virem a tomar uma decisão diferente.
Justificando o voto contra, a Coligação acrescenta que o Município ficará igualmente “responsável pela remodelação geral do interior do prédio, para adequação aos serviços, desconhecendo o valor das obras a efetuar”, tendo igualmente “prescindido do direito de preferência” em caso de venda do imóvel.
“A pergunta que se impõe é: porque razão o Executivo aceita este tipo de cláusulas?”, interroga Sónia Ramos, considerando tratar-se de um contrato “ruinoso” que “não assegura” os interesses do Município. Mesmo que o pagamento da renda seja feito através de verbas transferidas pelo Estado no âmbito da descentralização de competências, a Coligação sublinha que “o dinheiro do Estado é o dinheiro de quem trabalha e paga impostos” e dispara: “Se o Município tivesse, quando lhe competia, reorganizado os serviços, espaços e edificado, não tinha agora necessidade de esbanjar o erário público”.
Em resposta, a concelhia socialista emitiu um comunicado onde repete os argumentos usados pela vice-presidente da Câmara e acusa a vereadora social-democrata de “deriva populista e extremista” por “lançar dúvidas, insinuações e inverdades”.
PCP CRITICA “CONTRATO DANOSO” PARA O MUNICÍPIO
Em declarações ao “Brados do Alentejo”, o dirigente comunista Noel Moreira deixa antever o voto contra da CDU na Assembleia Municipal a este contrato de arrendamento.
“O contrato em si”, refere, “tem uma série de questões danosas nomeadamente o facto de ser logo à partida um valor muito avultado, pois estamos a falar de 48 mil euros por ano, com a possibilidade de variar o valor de forma anual de acordo com a alteração de rendas, que também foi proposta na altura pelo Governo do PSD-CDS, e que faz com que o valor possa ser aumentado anualmente para montantes que até podem chegar a ser incomportáveis para o Município”. Ainda para mais, acrescenta, “para “suportar um serviço que nem sequer devia ser da competência da Câmara Municipal”.
Referindo que o sentido de voto da CDU só será definido “numa data mais próxima” da decisão em Assembleia Municipal, Noel Moreira garante “compreender a necessidade de dar condições aos trabalhadores para poderem desempenhar funções, nomeadamente na área da ação social”, mas lembra que os comunistas sempre têm votado contra a transferência de competências do Estado central para os municípios.
“Não nos vamos esquecer que o PS tem maioria relativa [na Câmara e na Assembleia Municipal], pese embora ganhe e costume ter ao seu lado o PSD-CDS neste tipo de votações. Já se viu que desta vez isso não acontece, mas se MiETZ e PSD se abstiverem o contrato será aprovado”, resume o líder da bancada da CDU na Assembleia Municipal, sublinhando que “tudo dependerá do equilíbrio de forças que o PS conseguir e de negociações que forem feitas com essas forças políticas”
“É UM VALOR MUITO EXAGERADO”
O pagamento de uma renda mensal de 4000 euros, que será atualizada ao longo dos 10 anos de contrato, corresponde a “um valor muito exagerado”, disse o vereador Joaquim Crujo (MiETZ) em reunião de Câmara, referindo que “poderá haver outros locais” na cidade para acolher estes serviços. O MiETZ acabou por se abster na votação deste ponto, viabilizando a aprovação do contrato de arrendamento. Também o vereador Nuno Rato chamou a atenção para “o valor significativo” que está em causa, considerando que o Executivo socialista “não fez o trabalho de casa” no sentido de encontrar espaços alternativos.