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Bem-vindos a Pavia. Internet há quando há, telemóvel às vezes

Ana Luísa Delgado (texto) e Gonçalo Figueiredo (fotografia)

Internet que não funciona, serviço de telemóvel sem rede e emissão de televisão com cortes. É assim a vida em Pavia (Mora), apesar de Governo e empresas do setor prometerem a resolução do problema… mês após mês.

Presidente da Junta de Freguesia de Pavia (Mora), Custódia Casanova não esconde a dimensão do problema: “Temos grandes dificuldades no acesso à internet em toda a freguesia, há ruas onde não se consegue aceder e na aldeia da Malarranha ainda é pior, há até dificuldades no funcionamento das redes de telemóvel”.

O problema, acrescenta, não é de hoje. E constitui uma preocupação central desde que assumiu a presidência da Junta, em 2021. “Andamos a lutar para ver se resolvemos esta situação e dizem sempre que será para o próximo trimestre. A verdade é que nunca é, pelo menos nunca foi. Dizem agora que será neste trimestre, mas já estamos em setembro e tudo continua na mesma”.

Segundo a autarca, em Pavia até foi instalado o serviço de fibra ótica, “mas só está disponível em seis casas”. Nas restantes, bem como na rede móvel, os problemas de acesso são constantes. “Tudo isto é de uma injustiça inqualificável para com as pessoas que vivem no interior do país”, desabafa Custódia Casanova, referindo que noutras freguesias do concelho, como Cabeção ou Brotas, “não existe este tipo de dificuldade”, que chega a prejudicar o serviço de televisão: “Temos algumas antenas quase dentro do centro histórico e a verdade é que, por vezes, não se consegue ver televisão. Isto é indecente”.

O próprio funcionamento da Junta de Freguesia é afetado pela má cobertura de internet – “temos fibra, mas é de tão má qualidade que por vezes temos dificuldade em trabalhar, nem sequer se consegue abrir um email” -, daí resultando o que apelida de “discriminação negativa” face aos grandes centros urbanos.

“A nossa vila é muito bonita, mantém uma traça arquitectónica muito característica, somos procurados por muita gente, as pessoas até se podem querer instalar, ficar em teletrabalho, mas a internet não funciona. Estamos a perder a oportunidade de fixar população por um problema que já deveria estar resolvido há muito tempo”, critica a presidente da Junta, lamentando a existência de “dois países”: um, o litoral, “onde tudo existe”, o outro, o interior como Pavia e Malarranha, “onde até serviços básicos, como a internet, simplesmente não funcionam com o mínimo de qualidade”.

A autarca já escreveu à ministra da Coesão Territorial, à Comunidade Intermunicipal do Alentejo Central e às empresas de telecomunicações a denunciar o problema. Sem resultado. “Todos dizem que o vão resolver, mas nada acontece”.

Questionado sobre se tem conhecimento da insuficiente cobertura de ligações na freguesia de Pavia, o Ministério das Infraestruturas “acena” com a Estratégia Nacional para a Conetividade em Redes de Comunicações Eletrónicas de Capacidade Muito Elevada (2023/2030), aprovada no final do ano passado, com a qual pretende “garantir o acesso de toda a população” aos serviços de internet, “tendo como propósito assegurar a cobertura de todo o território nacional” ao longo dos próximos sete anos.

“O Governo considera prioritário o financiamento público das áreas de baixa densidade [populacional], devido à necessidade de potenciar o interesse dos operado- res em cobrir essas zonas, promovendo a coesão territorial e a valorização dos territórios do interior”, acrescenta o gabinete de João Galamba, não se comprometendo com datas concretas para a resolução de um problema concreto, mas sublinhando que a preocupação passa também por “não esquecer áreas mais densamente povoadas com carências de cobertura”:

Ainda segundo o Ministério das Infraestruturas, “os investimentos privados podem ser complementados, consoante necessário, por fundos públicos, nomeadamente em zonas em que não exista uma rede fixa ou em que não esteja credivelmente prevista a implantação de uma rede no horizonte temporal pertinente capaz de dar resposta às necessidades dos utilizadores finais”. Ou seja, ao reconhecimento da existência de problemas soma-se a disponibilidade do Estado para “apoiar” a expansão da rede nas regiões do interior, como Pavia e Malarranha, mas sem qualquer compromisso quanto a datas.

“JUSTA INDIGNAÇÃO”

“As populações de Pavia e Malarranha sentem-se justamente indignadas com esta situação”, critica o deputado comunista Bruno Dias, considerando que “não sendo caso único no território nacional, é inadmissível que em 2023 continuem sem se realizar os investimentos necessários que garantam cobertura de telecomunicações em todo o território”.

“É inaceitável a chantagem sistemática que as operadoras privadas têm exercido sobre o Estado português para que assuma os custos dos investimentos necessários para que depois venham recolher os lucros acumulados à custa dos elevados preços dos serviços disponibilizados às populações”, remata o deputado.

FALHAS NO SERVIÇO

Estudos da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) apontam para diversas falhas nos serviços de comunicação, no Alentejo, comuns aos diversos operadores (MEO, NOS e Vodafone). Um exemplo é a freguesia de Ciladas (Vila Viçosa), onde a qualidade da cobertura de rede chega a ser “inexistente” ou “muito má”, o mesmo sucedendo na zona da Anta da Azenha dos Apóstolos (Pardais). Acresce que nalguns locais, como em São Romão, o serviço de voz da MEO é “realizado com recurso a roaming”, ou seja, utilizando a rede espanhola. No concelho de Évora, os maiores problemas ocorrem na Boa Fé, Tourega, Guadalupe e Nossa Senhora de Machede, onde por vezes não existe cobertura de rede

“Similarmente, a prestação do serviço de dados teve pior desempenho onde a qualidade de sinal das redes móveis dos três operadores era também menor”, refere a Anacom. Já no concelho de Viana do Alentejo, é na freguesia de Alcáçovas que a cobertura da rede “é pior”. Ainda de acordo com o regulador, as metas de cobertura do 5G (90% da população até final de 2025) e o lançamento do concurso para levar fibra ótica à generalidade dos alojamentos, “permitirão alterar de forma muito significativa o panorama das telecomunicações em Portugal, possibilitando ultrapassar muitas das dificuldades com que os consumidores, particulares e empresas, se debatem atualmente.

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