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Arcebispo de Évora garante “tolerância zero” contra pedofilia

Ana Luísa Delgado e Maria Antónia Zacarias texto | Gonçalo Figueiredo fotografia

A chegada da data em que serão conhecidas as conclusões da comissão independente que está a investigar as denúncias de abusos sexuais na Igreja portuguesa está a “criar uma atmosfera muito pesada”, diz o Arcebispo de Évora. D. Francisco Senra Coelho diz que “não se pode confundir a árvore com a floresta”, mas diz que os casos já conhecidos constituem uma triste nódoa que caiu na toalha do altar da Igreja”.

“A Igreja é um espaço seguro. Quem não pode estar seguro na Igreja é o pedófilo”. A poucos dias de ser apresentado o relatório da Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa, o Arcebispo de Évora promete “tolerância zero” relativamente aos casos que vierem a ser conhecidos.

“Na diocese de Évora não haverá qualquer tipo de vacilação nesse assunto, como penso que não haverá nas outras dioceses”, acrescenta D. Francisco Senra Coelho, em entrevista exclusiva, classificando a existência destes casos como “uma triste nódoa que caiu na toalha do altar da Igreja” e garantindo que todas as eventuais suspeitas terão como consequência, imediata, o afastamento do pároco pelo menos até à conclusão do processo.

Aliás, lembra, na diocese de Évora, que abrange diversos municípios do distrito de Santarém, foi essa a atitude assumida em finais do ano passado quando surgiram suspeitas de que um padre de Samora Correia, no concelho de Benavente, teria escondido a prática de abusos sexuais. 

“O sacerdote não foi acusado de pedofilia, mas foi insinuado que teria permitido ou ocultado que um jovem que trabalhava com os acólitos teve uma atitude indevida para com duas meninas. Foi imediatamente retirado da paróquia, deixou de exercer e entrou em função a comissão diocesana que fez a investigação”, lembra. 

O caso foi analisado pelo Vaticano, que não encontrou conduta dolosa no comportamento do padre, embora considerando que foi “imprudente por não ter agido de modo mais incisivo”, e pelo Tribunal de Santarém que, em novembro de 2022, considerou “não haver indícios de nenhuma vontade de encobrimento ou de menosprezar os factos e as situações” denunciadas.

“O sacerdote pôs a pessoa fora da paróquia e depois, com base nas decisões dos tribunais civil e canónico, retomou o exercício normal de todas as tarefas pastorais, de que tinha sido preventivamente afastado para permitir todas as averiguações”, refere D. Francisco Senra Coelho, explicando o procedimento que irá adotar sempre que surjam suspeitas: “Serei eu próprio a verificar se a acusação tem o mínimo de credibilidade e a informar os serviços da Igreja, que estão preparados para a investigação, a polícia e o Ministério Público”. 

O Arcebispo de Évora reconhece que a divulgação do relatório está a “criar uma atmosfera muito pesada”, desde logo porque com o decorrer dos anos foi “aplicada uma rotulagem generalizada” a todo o clero, fruto de “uma leitura porventura conduzida com bases ideológicas”. Ou seja, refere, “a conclusão a que já cheguei é a de que este fenómeno não atinge, desde 1950, mais do que dois por cento de padres. Estamos a falar em 98 por cento de bons padres. Temos de compreender que uma coisa é a árvore e outra é a floresta”.  

Em qualquer dos casos, não deixa de criticar os sacerdotes que “tiveram comportamentos deste grau de indignidade absolutamente lamentável, triste, deplorável e vergonhoso”. E vai ainda mais longe: “Não poderíamos admitir que fosse nem um só caso na nossa missão, mas é algo de inevitável em todas as instituições, há simulações, há atitudes dúbias e na formação que damos aos sacerdotes são contextos que passam e que não conseguimos detetar”. 

“UM PECADO QUE BRADA AOS CÉUS”

Lembrando que o período que está a ser investigado pela comissão é bastante longo, atravessando boa parte do Estado Novo, a Guerra Colonial, o Maio de 68, o 25 de Abril ou a adesão à União Europeia, o Arcebispo de Évora sublinha que “a mentalidade mudou imenso” nestes mais de 70 anos. “Não me quero refugiar na mentalidade, mas é uma realidade. Durante muitos anos, a coisa que as famílias mais queriam era que não se soubesse. E esta era a mentalidade”. 

Uma “mentalidade” que, nalguns casos, terá levado ao silenciamento dentro da própria Igreja. “Esse facto, esconder, perante a ética e a moral cristãs, foi sempre inadmissível. Nós consideramos a pedofilia como um pecado que brada aos céus. Portanto, não tem desculpa. A única atitude que temos que assumir é de pedir desculpa e perdão pelos casos que aconteceram e que nós chamamos atos de ocultamento”, refere D. Francisco Senra Coelho, garantindo que “não havia conhecimento, dentro da Igreja, desta realidade, com esta proporção, que apesar de tudo é muito maior do que podíamos imaginar”. 

O Arcebispo de Évora está convencido que as mais de 420 denúncias que a comissão terá recebido a nível nacional, “muitas vezes através de um telefonema anónimo”, irão traduzir-se num “muito reduzido número de casos plausíveis”, que serão comunicados ao Ministério Público. Independentemente do número de casos, fala “numa espécie de sobressalto” que “nos deixou admirados, impressionados e indignados, tristes e envergonhados”. 

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