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Alandroal projeta Academia para promover o peixe do rio

Luís Godinho texto | Gonçalo Figueiredo fotografia

Chega ao fim, este domingo, dia 12, o Festival do Peixe do Rio, em Alandroal, concelho que a autarquia quer afirmar como “a capital da cozinha do peixe do rio” e para onde está projetada uma Academia destinada a salvaguardar as tradições desta arte.

“Para quê ir buscar peixe do mar quando temos um rio maravilhoso à nossa frente?”. A pergunta retórica, formulada por Ana de Brito, resume toda uma filosofia de vida e de negócio: no restaurante Raya, situado na praia fluvial das Azenhas d’El Rei, próximo de Montejuntos (Alandroal), aposta-se numa cozinha sustentável. “Entendemos que não podemos deixar pegadas de carbono em todas as nossas ações”. 

Sendo assim, quase tudo o que é consumido no restaurante tem origem na Terramay, ali ao lado, uma quinta onde se pratica agricultura regenerativa e onde há hortas, pomares, pastagens, cereais e animais com certificado biológico. E escreve-se “quase tudo” porque alguns produtos, como o sal, são comprados fora. E outros, como o pão, só dentro de dias irá começar a ser produzido pela equipa do restaurante.

“A nossa carta é micro sazonal, só utilizamos ingredientes da época, não há tomate no inverno nem limão no verão, tudo é produzido em modo biológico e não utilizamos organismos geneticamente modificados”, conta Ana de Brito, explicando que o objetivo é “atingir uma gastronomia sustentável, autêntica, que consiga apanhar todos os sabores naturais do Alentejo”.

Os pratos de carne, por exemplo, são feitos com porco preto ou vitela de mertolenga, criados na área de montado da Terramay. O peixe vem do Guadiana e, como adiante se verá, ha de chegar à mesa numa fusão de sabores entre a cozinha alentejana e a de outras partes do mundo. 

É também por isso que Ana de Brito considera que o Festival do Peixe do Rio, a decorrer até ao próximo dia 12 de março no concelho de Alandroal, é uma aposta “importante” na medida em que mostra ao mundo que “existem mais pessoas a pensar na mesma direção, a responsabilizar-se por um consumo mais sustentável e a buscar o bom que temos aqui na nossa terra e no nosso rio”.

Por essa cozinha de fusão deixemo-nos guiar pelo chef Diogo Pereira que depois de algumas experiências por vários pontos do mundo está agora à frente do Raya: “Temos tacos de lúcio-perca curado numa marinada de sal, açúcar e limão, com funcho e uma maionese de coentros para lhe dar um toque final, apresentados com picles de couve roxa e uma juliana de salada de rúcula”. 

Vencido o primeiro embate, seguimos com uma tempura – o tal prato típico do Japão que aí chegou levado por jesuítas portugueses no século XVI – de peixe do rio, “é já um clássico da casa”. E depois, explica o chef, haverá ainda ocasião para provar uma ceviche, “um prato muito reconfortante e fresco, ideal para a esplanada nos dias de calor”. Os temperos são biológicos, um “misto de sabores do Alentejo” a que não falta poejo ou louro, também eles oriundos da Terramay.

Diogo Pereira diz ter aceitado o desafio de vir trabalhar sabores regionais, produzidos localmente, por ter “sentido necessidade de fazer coisas diferentes, mudar a forma de estar na cozinha, mudar a forma de estar no mundo e ajudar a alterar mentalidades”. 

VALORIZAR TRADIÇÃO

Do rio ou da ribeira, os peixes, “apanhados com redes, serviam de conduto para ótimas açordas de tomate temperadas com hortelã da ribeira, ou eram simplesmente fritos”, escreve Maria Antónia Goes na “Carta Gastronómica do Alentejo”, onde vêm referenciadas quatro sopas, dois caldos e quatro caldeiradas de peixe do rio. Muda o nome, as receitas têm pequenas variações, mas a caldeta de barbo, ontem como hoje, continua a ter um lugar muito especial na mesa das povoações ribeirinhas.

Para a provar, por estes dias, não faltam propostas no concelho Alandroal, como os restaurantes A Chaminé, Adega do Ramalho ou A Maria, na sede de concelho, a Sentinela do Guadiana ou o Pata Larga, em Juromenha, o Tarro, na Aldeia da Venda, ou O Botas, em Terena. À caldeta juntam-se outros pratos tradicionais, como lúcio-perca grelhado, açorda de sável ou barbo frito com migas de espargos. Difícil será escolher.

“A ideia é fazer com que o peixe do rio chegue a mais pessoas, envolva mais a comunidade, crie mais dinâmicas económicas, contribua mais para a economia do concelho ao longo do ano”, explica o presidente da Câmara de Alandroal, João Grilo, acrescentando que a existência do festival permite “garantir” a quem visita o concelho que “pode haver procura adicional pois irá encontrar propostas de peixe do rio” nos diversos restaurantes aderentes à iniciativa.

“Queremos que o peixe do rio vá passando para as ementas dos restaurantes ao longo do ano, também em função da sazonalidade e da altura mais interessante para o consumo de cada espécie”, acrescenta o autarca, lembrando tratar-se de um “recurso natural com um potencial enorme”. Uma das apostas da autarquia será a criação da Academia do Peixe do Rio, resultado de uma candidatura de 300 mil euros a fundos comunitários.

“Estamos a preparar o projeto, mas a ideia é ter um espaço que ao longo do ano seja de investigação, exploração, apresentação… que quem venha ao concelho do Alandroal e queira saber mais sobre essa cultura do peixe do rio tenha um espaço onde possa encontrar informação e aprender”, explicou João Grilo, assegurando que será igualmente um “espaço de partilha” por onde irão passar diversos chefs ao longo do ano e um “repositório de uma época em todos os dias se perdem tradições, receitas, formas de trabalhar”.

A futura academia, acrescentou o autarca, permitirá “garantir que guardamos esta tradição do peixe do rio e que a colocamos à disposição de quem a quiser conhecer”, permitindo que “quem vem de forma tenha um local de aprendizagem para integrar esses conhecimentos e colocá-los à disposição das pessoas”.

“CAPITAL DA COZINHA”

Sem prejuízo de existirem outros locais onde “se trabalha e se promove a gastronomia do peixe do rio”, o concelho de Alandroal quer afirmar-se como “o centro das dinâmicas da gastronomia do rio”, aquilo que o presidente da Câmara, João Grilo, define como “capital da cozinha do peixe do rio”. A ideia é “valorizar” o trabalho feito nesta área, como o Festival do Peixe do Rio, agora a decorrer, mas também “para colocar novos desafios” a um setor que está em fase de afirmação. “Um dos aspetos fundamentais que temos de mudar é trazer o peixe do rio para o nosso dia a dia, na componente gastronómica e económica, mas também da investigação ao longo do ano”.

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